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Sobre isso de Fronteiras

[Dissoluções] – entre diálogos e beliscões.

Por Flor Di Castro

Quem é o outro?

O Eu sabe quem é, sabe as suas dores, seus medos, as suas angústias, o que o deixa feliz e o que o entristece. Mas e o Outro? Quem é?

O Outro é todo aquele que está além da fronteira do Eu. Que fronteira é essa?

Não se trata de algo simples, chega a parecer um espaço intransponível, uma verdadeira muralha que isola e limita o Eu. Tudo o que está separado do Eu, do lado oposto da fronteira, é incompreensível, é o Outro.  A fronteira do Eu é o que impede qualquer diálogo com o diferente, com o que não é espelho.

Na ausência de diálogos o Eu, então, cria uma imagem daquilo que não conhece, inventa, distorce, dá vida aos piores monstros. Surge o ódio.

 

Como quebrar essa fronteira?

Ao mesmo tempo em que é uma forte muralha, é possível rompê-la com um simples beliscão.

Houve um experimento feito em uma das orientações de Artes Visuais onde pedi para um artista vocacionado me beliscar, em seguida o belisquei. Logo perguntei: Você sentiu dor ao me beliscar? Não -- respondeu. Mas sentiu dor quando lhe belisquei? Sim -- afirmou.

Nós sentimos dores diferentes, com intensidades diferentes, eu nunca saberei o que ele de fato sentiu nem o contrário, mas de uma coisa sabemos: tanto eu quanto ele sentimos alguma dor ao ser beliscado. Nesse momento a fronteira foi derrubada, o Eu e o Outro deixaram de existir, dando lugar a dois seres humanos que coexistem, apesar de possuírem trajetórias distintas.

Essa simples experiência exemplifica bem o que tentamos (des)construir durante as nossas Orientações de Artes Visuais.  O ponto de partida não foi a técnica, mas sim a criação de diálogos como verdadeiras pontes de compreensão.

 

As Artes Visuais e suas pontes

O entendimento sobre o que seria ‘Artes Visuais’ foi amplamente discutido. Saímos da velha dupla já conhecida (desenho e pintura) e experimentamos outras possibilidades.

Utilizamos materiais que eram considerados “lixo” pela sociedade, como restos de madeiras, garrafas plásticas, vidro quebrado e velhos banners. A intenção não era usá-los como forma de adaptar o que não se tinha, mas sim perguntando o que tal material teria a nos oferecer, onde habitava a sua força.

Também transformamos em arte atos que são menosprezados pela a maioria, como pintar os cabelos ou escrever um cartaz. Afinal, quem quer que x filhx seja cabeleireirx? Lixeirx então, nem pensar!

Mesmo quando era uma técnica que envolvia lápis e/ou tinta mudávamos o suporte tradicional ou colocávamos uma interação ou jogo no meio, como o Quebra-cabeça Gigante, feito para o Encontrão da Equipe Leste 1, onde cada participante ganhava uma peça do quebra-cabeça sem saber do que se tratava até que em algum momento entendiam e começavam a montar.

A ideia sempre foi fazer arte pensando em pontes, valorizando aquilo que nunca é visto, dando voz ao que é comumente amordaçado, seja um ser animado ou não.

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